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Revista de Autofagia nº 3

Durante a semana eu pensei em várias pautas para esse poste. Podia falar das reformas da Lei Rouanet e da criação do Fundo Nacional de Cultura; da reunião que tivemos com o ministro Juca Ferreira para tratar desse assunto; do show que farei na próxima quinta no Parque Municipal, aqui em Belo Horizonte; da criação do meu perfil no twitter; da seleção para participar de um festival em Londres, no mês de novembro; dos shows que rolaram em Brasília e no Rio nas últimas semanas e das conversas com Tom Zé no camarim do Palácio das Artes; da participação no belíssimo e delicado show da Maísa no Teatro Alterosa; dos discos do Rafael Macedo, do Leo Minax e da Carol Saboya, que chegaram esta semana com canções minhas; da viagem que farei para Alagoas no início de maio; do seminário internacional sobre música que estou ajudando a organizar e da mesa que vou mediar na semana que vem; etc.

Acontece que hoje chegou da gráfica o terceiro número da Revista de Autofagia! Para quem não sabe é uma revista em papel que eu e Bruno Brum insistimos em publicar desde 2006. Entre burocracias com a liberação do recurso do fundo municipal de incentivo, a seleção do material, revisão, projeto gráfico e a edição estamos nessa batalha há quase um ano. Isso sem esquecer que o segundo número não teve, por assim dizer, um lançamento oficial. Chegamos a pensar em nem fazer mais lançamentos, ou no máximo lançar alguns exemplares do alto dos arcos do viaduto de Santa Tereza, num ato simbólico de desprendimento material e crítica ao mercado editorial estabelecido. Por fim resolvemos fazer tudo como manda o figurino e vamos marcar para breve o lançamento dos dois números de uma vez com coquetel, performance e autógrafo dos autores participantes.

Downloads

Resolvemos também disponibilizar os dois primeiros números em PDF:

Revista de Autofagia nº 1 (clique na imagem)

Revista de Autofagia nº 2 (clique na imagem)

Quero aproveitar e agradecer o pessoal que está ajudando a semear: Sandro Saraiva, Marcelo Terça-Nada, Leo Gonçalves, Reuben da Cunha e Marcelo Sahea

Serviço de utilidade pública

Para quem ainda não sabe, Bruno Brum se mudou para uma casa mais espaçosa, um condomínio no campo, onde se dedica, ao lado de sua mulher Helena Brun, à poesia, à criação de gatos Bengal e à arte de manipular imagens e textos de forma a conseguir o maior impacto e o melhor equilíbrio visual. Dê um pulo lá!

Improviso em Pequim

Por fim, deixo aqui esse longo poema épico do genial e tresloucado Allen Ginsberg, na tradução do Leo Gonçalves que incluímos (em versão bilíngüe) neste novo número da revista:

Eu escrevo poesia porque a palavra Inglesa Inspiração vem do Latim Spiritus, respiração, eu quero respirar livremente.
Eu escrevo poesia porque Walt Whitman deu permissão mundial para falar com candor.
Eu escrevo poesia porque Walt Whitman abriu os versos da poesia para a respiração desobstruída.
Eu escrevo poesia porque Ezra Pound viu uma torre de marfim, apostou num cavalo errado, deu aos poetas permissão para escrever no idioma vernacular falado.
Eu escrevo poesia porque Pound indicou aos jovens poetas do Ocidente que observassem as palavras da escrita pictográfica chinesa.
Eu escrevo poesia porque William Carlos Williams que vivia em Rutherford escreveu o
Novajerseyês “I kick yuh eye”, perguntando, qual a medida disso em pentâmetro iâmbico?
Eu escrevo poesia porque meu pai era poeta minha mãe vinda da Rússia que falava
Comunista, morreu numa casa de loucos.
Eu escrevo poesia porque meu jovem amigo Gary Snyder sentou-se para olhar seus pensamentos como parte dos fenômenos do mundo exterior exatamente como numa mesa de conferência em 1984.
Eu escrevo poesia porque eu sofro, nascido que sou para morrer, pedras nos rins e pressão alta, todo mundo sofre.
Eu escrevo poesia porque eu fico confuso por não saber o que as outras pessoas pensam.
Eu escrevo porque a poesia pode revelar os meus pensamentos, curar minha paranóia e também a paranóia de outras pessoas.
Eu escrevo poesia porque minha mente vagueia entre assuntos de sexo política meditação Buddhadharma.
Eu escrevo poesia para fazer boa imagem da minha própria mente.
Eu escrevo poesia porque tomei os Quatro Preceitos do Bodhisattva: a sensibilidade a ser liberada das criaturas é inumerável no universo, minha própria ignorância gananciosa corta a infinitude da verdade, as situações em que encontro a mim mesmo enquanto o céu está bonito são incontáveis, e o caminho da mente desperta não tem fim. Eu escrevo poesia porque essa manhã eu acordei tremendo com medo o que é que eu iria dizer na China?
Eu escrevo poesia porque os poetas Russos Maiakóvski e Iessênin cometeram suicídio, alguém mais precisa falar.
Eu escrevo poesia por causa do meu pai que recitava o poeta Inglês Shelley e o poeta americano Vachel Lindsay em voz alta dando exemplo grande alento de inspiração.
Eu escrevo poesia porque escrever sobre sexo é censurado nos Estados Unidos.
Eu escrevo poesia porque milionários de Leste a Oeste dirigem Limousines Rolls-Royce e pobres não têm dinheiro nem para ir ao dentista.
Eu escrevo poesia porque meus genes e cromossomas se apaixonam por garotos e não por garotas.
Eu escrevo poesia porque não tenho responsabilidades dogmáticas de um dia para o outro.
Eu escrevo poesia porque eu quero estar sozinho e quero falar para as pessoas.
Eu escrevo poesia para me voltar e falar com Whitman, jovens aos dez anos falam com
velhas tias e tios que vivem ainda nas proximidades de Newark, Nova Jersey.
Eu escrevo poesia porque ouvi negro blues no rádio em 1939, Leadbally e Ma Rainey.
Eu escrevo poesia inspirado pela alegre juventude das canções envelhecidas dos Beatles.
Eu escrevo poesia porque Chuang-Tzu não podia dizer se era homem ou borboleta, Lao-Tzu disse que a água flui montanha abaixo, Confúcio disse para honrar os mais velhos, eu quis honrar Whitman.
Eu escrevo poesia porque ovelhas e gado superalimentados vindos da Mongólia para o Ocidente Selvagem dos Estados Unidos destroem a grama nova e a erosão cria desertos.
Eu escrevo poesia calçando sapatos com pele de animal.
Eu escrevo poesia “Primeira idéia, melhor idéia” sempre.
Eu escrevo poesia porque não-idéias são compreensíveis exceto se manifestadas em
determinados minutos: “Não-idéias mas nas coisas”.
Eu escrevo poesia porque o Lama Tibetano diz, “As coisas são símbolos delas mesmas”.
Eu escrevo poesia porque as manchetes de jornal são um buraco negro em nossa
galáxia-central, nós somos livres para noticiar isto.
Eu escrevo poesia por causa da Primeira Guerra Mundial, a Segunda Guerra Mundial, a
bomba nuclear e a Terceira Guerra Mundial se queremos isto, eu não preciso disto.
Eu escrevo poesia porque meu primeiro poema Uivo não precisou ser publicado para ser perseguido pela polícia.
Eu escrevo poesia porque meu segundo longo poema Kaddish homenageava o parinirvana da minha mãe num hospital psiquiátrico.
Eu escrevo poesia porque Hitler matou seis milhões de judeus, eu sou judeu.
Eu escrevo poesia porque Moscou, segundo Stalin, exilou 20 milhões de Judeus e
intelectuais na Sibéria, 15 milhões deles nunca voltaram para o Café Stray Dog de São Petersburgo.
Eu escrevo poesia porque eu canto quando sinto que estou sozinho.
Eu escrevo poesia porque Walt Whitman disse “Eu me contradigo? Muito bem, então eu
me contradigo (Sou vasto, contenho multidões.)”
Eu escrevo poesia porque minha mente se contradiz, um minuto em Nova York, o próximo minuto nos Alpes Dináricos.
Eu escrevo poesia porque minha cabeça contém 10.000 pensamentos.
Eu escrevo poesia porque sem razão sem porquê.
Eu escrevo poesia porque é o melhor caminho para dizer tudo o que penso dentro de 6 minutos ou uma vida inteira.

Postado em 18/04/2009 Blog!

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Sobre o autor

Makely Ka (Valença do Piauí, 1975) é um poeta cantor, instrumentista, produtor cultural e compositor brasileiro. Makely é poeta, compositor e agitador cultural. Atuando em diversas áreas como a música, a poesia e o vídeo. Incorpora à sua produção artística um componente crítico e reflexivo. Autodidata, desenvolveu uma poética musical própria, amalgamando elementos da trova e do aboio de herança ibérica às novas linguagens sonoras urbanas como o rap, do despojamento da poesia marginal ao rigor formal da poesia concreta.

(19) respostas

  1. oficinadolivro
    18/04/2009 de 10:46 · Responder

    Bravo!!!
    Leo tem comentado a respeito da Autofagia nº 3. Confesso que estou bem ansiosa para tê-la em minhas mãos. Ele diz que está estupenta!
    E eu não tenho dúvidas disso.
    Abraços!

  2. reuben!
    18/04/2009 de 11:07 · Responder

    só notícia de primeira, makely! é bom ver as coisas acontecendo. depois me conta do papo com o ministro. grande abraço!
    reuben

  3. Fábio Aristimunho
    19/04/2009 de 03:06 · Responder

    Olá, Makely,

    A editora está atrasada na distribuição para fora de São Paulo. Procure nas grandes redes de livrarias, sei que os livros já estão disponíveis nos sites da Saraiva e da Livraria Cultura.

    Os galegos traduzidos: Martim Codax, Meendinho, Airas Nunez, Pero da Ponte, Joam de Cangas, Afonso X: Cantigas de Santa Maria, Paio Gomez Charinho, Macias o Namorado, Cura de Fruíme, Xosé Cornide, Francisco Añón, Rosalía de Castro, Marcial Valladares Núñez, Eduardo Pondal, Manuel Curros Enríquez, Manuel Leiras Pulpeiro, Amador Montenegro, Xoán Vicente Viqueira Cortón, Luís Amado Carballo, Manuel Antonio, Federico García Lorca.

    Abraço
    Fábio

  4. mary
    20/04/2009 de 08:31 · Responder

    bacana, bacana,
    se precisar de contatos em Londres, me dê um toque.
    parabéns pela revista.
    sucesso nos projetos.
    🙂

  5. marcelo sahea
    21/04/2009 de 23:28 · Responder

    Tamos aí!
    Sucesso!

  6. oficinadolivro
    22/04/2009 de 22:02 · Responder

    Makely,

    Achei muito boa a curadoria da revista e estou irremediavelmente apaixonada pelo texto do Ginsberg.
    Acabei lendo sem interrupções e foi muito prazeroso ser conduzida pelo universo que este número se propôs. A revista tá bem coesa.Embala o leitor!
    Parabéns pelo trabalho de vocês.
    Abraços,
    Águeda Couto.

  7. Pedro Paulo
    23/04/2009 de 16:14 · Responder

    Olá Makely,

    Conheci seu trabalho a partir do Tom Zé – show no Palácio das Artes. Gostei muito da densidade das suas letras, como você passeia pelos ares filosóficos e cotidianos, e tudo isso regado de muita poesia. Você é realmente original – coisa difícil de se ter ultimamente. Também achei muito legal saber que é daqui de BH. Vou ler os dois primeiros números da revista que disponibilizou aqui no blog e, assim, espero superar uma falta, um erro, meu: não ter um contato maior com a arte produzida atualmente nas nossas Minas Gerais. (…) Hoje vou apreciar seu espetáculo lá no Parque Municipal. Sucesso. =)

  8. Anonymous
    24/04/2009 de 09:57 · Responder

    ué renato, dando um de funcionário fantasma? rssss
    me conta uma coisa? seu cd já ta no pino?
    e o nome/ já pode saber?
    abraços,
    águeda couto

  9. Marcelo Terça-Nada
    24/04/2009 de 11:03 · Responder

    Oi Makely,
    Adorei o show no Conexão. Foi muito bom.

    Obrigado pelo link para o Vírgula-imagem.

    Abraços,
    Marcelo

  10. Renato Negrão
    24/04/2009 de 11:33 · Responder

    puta show !

  11. Rodrigo Jerônimo
    24/04/2009 de 16:48 · Responder

    bom poder saber que tem artistas preocupados como vc Makely, acabo de lançar meu blog dá uma olhada lá..
    Rodrigo Jerônimo
    www.alucinacoesesteticas.blogspot.com

  12. Renato Villaça
    24/04/2009 de 23:39 · Responder

    oi agueda!

    tamo aí na luta.
    o cd tá mixado e vamos masterizar logo. mas como não tenho patrocínio dependo muito da boa vontade alheia e de tempo pra assumir as coisas sozinho. daí tudo demora um pouco mais. mas acho que ém agosto ou setembro já tá aí.
    apareça no blog: www.renatovill.blogspot.com

    até.

  13. fred girauta
    27/04/2009 de 14:57 · Responder

    fala cara!
    tudo muito do caralho!
    participei da autofagia 1,
    gostaria de colaborar em outros projetos.

    abração!

  14. On The Rocks
    30/04/2009 de 14:45 · Responder

    curti teu som no last fm. bem ritmado. swingado. bacana.

    abs

  15. makely
    02/05/2009 de 14:32 · Responder

    Reuben, você precisa vir mais a Minas. Em 24 horas não dá para colocar o assunto em dia…

    Marceleza, você também podia vir para o lançamento do terceiro, porque as oportunidades são tão poucas que o melhor é re-lançar todos os números a cada oportunidade.

    Fábio, grato pela informação. Soube que o livro já chegou nas livrarias da cidade. Vou logo buscar o meu.

    Mary querida, quero todos os contatos sim. E seu exemplar segue em breve, em mãos!

    Águeda, que bom que você gostou da revista! Quem sabe não conseguimos incluir uma encadernação especial no projeto das próximas levas?

    Salve Pedro, seja bem-vindo!

    Villaça, não se preocupe, você não está no conselho editorial.

    Salve Terça, salve Negrão! Legal que vocês curtiram a parada, apesar dos problemas técnicos no início.

    Jerônimo, já está linkado! Abraços

    Fred meu camarada, nós ainda usamos a logo que você criou para a revista (devidamente creditada!). Mande seu endereço para eu enviar uns exemplares!

    Valeu On The Rocks! Volte sempre.

  16. pirata z
    04/05/2009 de 12:34 · Responder

    separa uma pra mim! indo aí, te ligo, aí a gente, primeiro, mata a saudade, depois, troca figurinhas e plás.
    vou atrás do documentário que me recomendou, pelo qual já agradeço.
    breve, aquelas coisas que, tempos atrás, conversamos sobre a rádio pirata. tudo ao seu tempo.
    baita abraço

  17. CGaldino
    07/05/2009 de 19:23 · Responder

    Na era da informação me peguei desinformado. Estamos na 3a. edição da revista de autofagia, CARAMBA! Valeu de mais disponibilizar os Portable Document Format’s das revistas antigas para baixar!
    Parbéns pelo trabalho e paz na empreitada!

    ABS

  18. zema ribeiro
    09/06/2009 de 17:12 · Responder

    como eu compro o número 3? abraço!

    zema ribeiro
    zemaribeiro@gmail.com

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