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Pensamentos Selvagens

Claude Lévi-Strauss, que completa hoje 100 anos de vida

“Coisa estranha é a escrita. Tudo indicaria que sua aparição não poderia deixar de determinar mudanças profundas nas condições de vida da humanidade; e que essas transformações deveriam ser, acima de tudo, de natureza intelectual. Depois de eliminarmos todos os critérios propostos para distinguir a barbárie da civilização, gostaríamos de reter pelo menos este: povos com ou sem escrita, uns capazes de acumular as aquisições antigas e progredindo cada vez mais rápido rumo ao objetivo que se fixaram, ao passo que os outros, impotentes para reter o passado além dessa franja que a memória individual é suficiente para fixar, permaneceriam prisioneiros de uma história flutuante à qual faltariam sempre uma origem e a consciência duradoura de um projeto.

Contudo, nada do que sabemos sobre a escrita e seu papel na evolução justifica tal idéia. Uma das fases mais criativas da história da humanidade situa-se no início do Neolítico, responsável pela agricultura, pela domesticação dos animais e por outras artes. Para chegar a isso, foi preciso que, durante milênios, pequenas coletividades humanas observassem, experimentassem e trasmitissem o fruto de suas reflexões. Essa imensa empreitada desenrolou-se com um rigor e uma continuidade atestadas por seu sucesso, enquanto a escrita ainda era desconhecida.

Se quisermos estabelecer a correlação entre o aparecimento da escrita e certos traços característicos da civilização, convém procurar em outro rumo. O único fenômeno que a acompanhou fielmente foi a formação das cidades e dos impérios, isto é, a integração num sistema político de um número considerável de indivíduos e sua hierarquização em castas e em classes. Em todo caso, esta é a evolução típica à qual assistimos, desde o Egito até a China, no momento em que a escrita faz sua estréia: ela parece favorecer a exploração dos homens, antes de iluminá-los. Há que se admitir que a função primária da comunicação escrita foi facilitar a servidão. O emprego da escrita com fins desinteressados, visando extrair-lhes satisfações intelectuais e estéticas, é um resultado secundário, se é que não se resume, no mais das vezes, a um meio para reforçar, justificar ou dissimular o outro.”

Trecho do livro Tristes Trópicos, publicado em 1955
Tradução de Rosa Freire d’Aguiar

Postado em 28/11/2008 Blog!

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Sobre o autor

Makely Ka (Valença do Piauí, 1975) é um poeta cantor, instrumentista, produtor cultural e compositor brasileiro. Makely é poeta, compositor e agitador cultural. Atuando em diversas áreas como a música, a poesia e o vídeo. Incorpora à sua produção artística um componente crítico e reflexivo. Autodidata, desenvolveu uma poética musical própria, amalgamando elementos da trova e do aboio de herança ibérica às novas linguagens sonoras urbanas como o rap, do despojamento da poesia marginal ao rigor formal da poesia concreta.

(7) respostas

  1. Guilherme Castro
    29/11/2008 de 10:55 · Responder

    Nuh… pensamentos selvagens mesmo! Bacana o texto!

  2. andrea lion
    30/11/2008 de 00:45 · Responder

    (nossa, que coisa difícil postar um coment…..)
    também gostei do texto makely.
    e das fotos dele também.
    grande pensamento!!!
    bj

  3. marden
    01/12/2008 de 13:14 · Responder

    é!

  4. matheus matheus
    01/12/2008 de 17:39 · Responder

    “reforçar, justificar ou dissimular.”
    hum… acho que me identifiquei. me enquadro no “resultado secundário”.

  5. makely
    01/12/2008 de 23:10 · Responder

    Pois é Guillherme, esse é só um trecho, vale a pena ler o resto. Essa é a idéia!

    Adrea, seja bem-vinda! Qual foi a dificuldade?

    Abraços Marden!

    Matheus Matheus, o resultado secundário é a nossa função, ainda que seja utópica…

  6. andrea lion
    03/12/2008 de 11:32 · Responder

    dificuldade superada!!! problemas com a internet mesmo!!!!
    boa viagem à galícia!!!!!!!! delícia!!! ops………. rsrs

  7. dani morreale diniz
    03/12/2008 de 13:04 · Responder

    Na verdade não entendi ainda como ele começou a ESCREVER o pensamento. Talvez seja “para reforçar, justificar ou dissimular o outro”. rararara!

    Boa viagem. Traga os bons!

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